terça-feira, 14 de junho de 2011

Filosofia no Vestibular da UERJ - com erro?

A primeira etapa do vestibular da UERJ 2012, realizada no dia 12/06/11, traz uma questão que diz respeito à filosofia:

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Questão 53:
"O Iluminismo é a saída do homem do estado de tutela, pelo qual ele próprio é responsável. O estado de tutela é a incapacidade de utilizar o próprio entendimento sem a condução de outrem. Cada um é responsável por esse estado de tutela quando a causa se refere não a uma insuficiência do entendimento, mas à insuficiência da resolução e da coragem para usá-lo sem ser conduzido por outrem. Sapere aude!* Tenha a coragem de usar seu próprio entendimento. Essa é a divisa do Iluminismo."
In: BOMENY, Helena e FREIRE-MEDEIROS, Bianca. Tempos modernos, tempos de sociologia. São Paulo: Ed. do Brasil, 2010.
IMMANUEL KANT (1784)
*Expressão latina que significa “tenha a coragem de saber, de aprender”.

No contexto da expansão capitalista no século XIX, uma das ideias centrais do Iluminismo, de acordo com o texto, está associada diretamente à valorização da:

(A) superioridade técnica
(B) soberania econômica
(C) liberdade política
(D) razão científica

Gabarito oficial: D
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Apesar do gabarito oficial dizer que a resposta correta é letra D, parece-me que há um erro ou pelo menos uma ambiguidade que prejudica a questão.
O enunciado pede para identificar uma das ideias centrais do Iluminismo "de acordo com o texto" citado.
Ora, o texto citado faz referência ao caráter político da liberdade de pensar, já que trata-se de pensar sem a tutela de outrem.
Além disso, não há qualquer referência no texto citado à razão científica, a não ser que se considere que a liberdade de pensar é necessária para a ciência.
De fato o é, mas a relação mais imediata a ser feita é com a liberdade política, e não com a razão científica - pois essa incluiria outros elementos, como a experimentação.
Quem conhece o texto de Kant (que está publicado neste blog: http://filoescola.blogspot.com/2011/03/k.html), sabe também que os argumentos ali desenvolvidos por ele referem-se a aspectos políticos, muito mais do que científicos.

Assim, a alternativa mais adequada ao enunciado seria a letra C, e não a letra D...

No mínimo, as duas alternativas poderiam ser consideradas corretas.

Apresentei essa contestação a outros professores de filosofia, aguardo comentários para decidir se ela deve ser levada aos formuladores da prova da UERJ.

No endereço abaixo, pode-se ver a prova e o gabarito, além de outras informações sobre o vestibular da UERJ:
http://www.vestibular.uerj.br/portal_vestibular_uerj/index_portal.php

4 comentários:

  1. Realmente a questão é absurda! Mesmo uma pessoa que nunca tivesse ouvido falar em Filosofia, se relacionasse a questão com o texto responderia a C. E qualquer pessoa que já tenha estudado também, já que a questão é claramente política. Com todas as letras o texto fala sobre a coragem de assumir a liberdade e agir politicamente.Que o vestibular é repleto de pegadinhas para a eliminação de candidatos, já estamos cansados de saber, mas no mínimo espera-se que essas pegadinhas sejam feitas sem erros.
    Iara Hillen

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  2. Concordo plenamente com você, Iara, e agradeço pelo comentário.

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  3. uma amiga me apresentou um argumento forte, contrário ao meu. tento resumir: se a questão trata do iluminismo, é certo que um elemento central desse movimento é a busca pelo conhecimento e o desenvolvimento da ciência, e se o texto do Kant fala na coragem de usar o próprio entendimento sem tutela, pode-se entender que essa coragem se refere ao desenvolvimento da razão científica.

    hum, mas mesmo aceitando que a interpretação dela esteja correta, a questão ainda me parece ambígua, pois o argumento não é suficiente para dizer que o item (c) estaria errado.

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  4. Publico também a resposta da Banca, enviada por email:

    "Em diálogo com as considerações apresentadas acerca do gabarito da questão 53, julga-se importante ponderar que o fragmento de texto de Immanuel Kant concebe o Iluminismo como a “saída do homem do estado de tutela, pelo qual ele é o próprio responsável”. Tal afirmação remete a uma concepção de sujeito humano autônomo, racional e auto-referencial na dimensão de, entre outras atitudes, “ter coragem de usar seu próprio entendimento (...) sem ser conduzido por outrem”. Assim, compreende-se que os usos da liberdade, no campo político e moral, seriam correlatos a essa concepção de sujeito, possuindo implicações nas suas formas de agir e de saber, bem como nas relações entre ambas. Insere-se, nesse campo, o valor da razão, associada à ciência moderna, na qualidade de saber metódico e focado no sujeito capaz de conhecer e decifrar o mundo por si mesmo.
    É necessário, no entanto, que o comando da questão estabeleça a circunscrição de experiências históricas específicas para que o aluno de ensino médio – a quem se destina, prioritariamente, a prova – tenha possibilidade de respondê-la lançando mão dos elementos ali disponíveis, ou seja, a associação entre determinadas ideias do Iluminismo e um único contexto, o da expansão capitalista no século XIX.
    Tais pressupostos têm, com consequência, a constatação de que as novas técnicas produtivas, viabilizadoras da modernidade industrial e tipificadoras da expansão capitalista, derivaram-se da valorização e da aplicação da razão científica, muito mais do que da liberdade política."

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