sábado, 19 de março de 2011

Mário de Andrade e Platão

O Losango Cáqui, 1924

XXXIII
"Prazeres e dores prendem a alma no corpo como um prego. Tornam-na corporal ... Consequentemente é impossível pra ela chegar pura nos Infernos."
Platão

Meu gozo profundo ante a manhã Sol
a vida carnaval...
Amigos
Amores
Risadas
Os piás imigrantes me rodeiam pedindo retratinhos
de artistas de cinema, desses que vêm nos maços de cigarros
Me sinto a Assunção, de Murillo!

Já estou livre da dor...
Mas todo vibro da alegria de viver.

Eis porque minha alma inda é impura.

XXXIII bis *
PLATÃO

Platão! por te seguir como eu quisera
Da alegria e da dor me libertando
Ser puro, igual aos deuses que a Quimera
Andou além da vida arquitetando!

Mas como não gozar alegre quando
Brilha esta alva manhã de primavera
- Mulher sensual que junto a mim passando
Meu desejo de gozos exaspera!

A vida é bela! Inúteis as teorias!
Mil vezes a nudeza em que resplendo
À clâmide da ciência, austera e calma!

E caminho entre aromas e harmonias
Amaldiçoando os sábios, bendizendo
A divina impureza de minha alma.

* Publicado na Klaxon o poema anterior causou hilariedade. Era natural. Por caçoada vesti minhas sensações e ideias com este soneto.


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